A Era de Mulheres “Ageless” Estratégias para o Envelhecimento Bem Sucedido

“Ageless Women” ?

Vocês podem estar se perguntado neste momento, o que de fato significa uma “Ageless Woman”?  Como assim?  Uma mulher menos envelhecida?

Isso mesmo caros leitores, um tema que eu já tenho abordado em diferentes contextos e oportunidades é o que costumamos chamar de envelhecimento saudável.  Envelhecimento sim por que não?  Sem medo ou tabu, começamos a envelhecer no dia em que nascemos.  O que importa realmente não é quando e sim como. 

Eu prefiro a abordagem da expectativa de saúde ou “Healthspan”  ao invés de expectativa de vida ou como conhecemos “Lifespan”. 

Assim, quando eu me deparei com o termo “Ageless Woman” em um artigo sobre uma mulher que aos 58 anos decidiu começar a carreira e fazer sucesso como modelo fotográfico, tratava-se de fato de uma mulher atemporal que estava no comando da sua vida, além do próprio tempo.

Na verdade, encontramos vários exemplos assim, e a pergunta é o que move essas mulheres? Muito possivelmente é a sua energia que ao longo da vida vai sendo modulada pelas suas próprias fases. 

A mulher entre os 30 e 40 anos, abriga uma carga adicional de pressão e estresse para conciliar a vida profissional, familiar, social e pessoal.  Porém após os 40 e 50 anos, o momento é de maturidade, movido pela energia da mudança e a forma como essas mulheres encaram essas mudanças. Acompanhando a maturidade, vem a calma, a experiência e a independência, mas também certamente vem mudanças física e emocionais.

E este é ponto chave: se esta mulher seguir conciliando essa maturidade com a percepção correta e a satisfação com suas mudanças físicas e emocionais, o sucesso da “Ageless Woman” é certo.

O envelhecimento saudável ou bem sucedido como também é denominado na literatura científica, é um fator que pode estar em grande parte sob nosso próprio controle.

“A forma como você envelhece é uma questão de como você se trata e não de como a vida te trata.”                                                                                                                                  Nancy Lonsdorf

Cuidados preventivos são a chave para o envelhecimento bem sucedido

Segundo a OMS, sSaúde é um estado de completo bem estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doença. 

No Brasil, as principais causas de morte da população feminina são as doenças cardiovasculares; seguidas pelas neoplasias, especialmente o câncer de mama, pulmão e colo de útero; a seguir estão as doenças respiratórias e finalmente, as doenças endócrinas nutricionais e metabólicas com especial atenção para o diabetes (IBGE,2000)

O divisor de águas para as mulheres entre a juventude e a maturidade é a Menopausa e o período de Climatério. As mudanças físicas e emocionais que acompanham esta fase, vão muito além do fim da possibilidade da reprodução, e tem impacto significativo em muitos aspectos, como por exemplo: o “turnover de colágeno” e a saúde de pele, cabelos e unhas;  a densidade mineral óssea (DMO) e a saúde óssea;  a composição corporal em relação a massa muscular e gordura corporal; a saúde cardiovascular; a saúde mental e cognitiva; a saúde do aparelho geniturinário e a saúde sexual.

De modo que, o foco deste artigo não está no desequilíbrio hormonal e nos sintomas clássicos da menopausa, uma vez que o desequilíbrio hormonal é um gatilho importante, mas não é o único. Além disso, os sintomas vasomotores, embora prevalentes em 60 a 80 % das mulheres durante o climatério, são transitórios e nem sempre estão relacionados ao declínio funcional que é o principal foco deste artigo. Isto não significa, claro, que tais sintomas não mereçam atenção, pois interferem fortemente na qualidade de vida das mulheres e devem ser tratados e contidos de forma segura.

No entanto, as perdas e declínios funcionais durante o climatério, tem relação direta com o funcionamento e equilíbrio de fatores bioquímicos, metabólicos e hormonais, que podem ser prevenidos e controlados com base nos hábitos de vida e nas estratégias de prevenção e tratamento seguidos com disciplina ao longo de toda a vida.

Os cuidados preventivos são as melhores formas de manter a saúde em qualquer fase, especialmente durante o climatério.

Um importante trabalho, denominado SWAN (Study of Women’s Health Across the Nation) que acompanhou mais de 3300 mulheres com idade entre 42 e 52 anos ao longo de 23 anos de suas vidas, com o objetivo de definir o período denominado de Transição da Menopausa. Este trabalho avaliou as principais queixas de saúde das mulheres na idade madura e correlacionou com o período denominado Transição da Menopausa, ou seja, os anos que imediatamente antecedem a menopausa propriamente dita ou o último período menstrual da vida da mulher bem como os anos posteriores. 

Esta análise se mostra fundamental para elucidar a “janela de oportunidade”, período ideal para intervenções, especialmente de caráter preventivo.

Neste artigo, que foi dividido em duas partes, serão abordados, nesta primeira parte, os principais marcadores de saúde que devem ser monitorados e fortalecidos, destacando o período mais relevante para as intervenções.  Já na segunda parte, serão abordadas algumas das estratégias e intervenções que podem ou que talvez devam ser adotadas sem perda de tempo, estratégias que serão fundamentais para o envelhecimento bem-sucedido, conforme mencionado no início.

Saúde de pele, cabelos e unhas

A menopausa define-se pelo estado de declínio de produção hormonal, especialmente estrogênios, que afeta a pele e seus anexos, cabelos e unhas, através da aceleração da degradação do colágeno e redução da elastina, desidratação e prejuízo ao processo de cicatrização. A perda de colágeno resulta na falta de tônus, firmeza e elasticidade da pele. A falta de estrógenos também é associada a perda da capacidade de retenção de água, resultando no ressecamento e falta de viço da pele, o que leva à maior fragilidade da pele e consequentemente formação de mais numerosas e mais profundas rugas.

A queda capilar generalizada e difusa também é prevalente, sendo reportada em 26% das mulheres na pós-menopausa. A queda capilar na região frontal pode se manifestar em 9% dessas mulheres.

A alopecia androgenética feminina ou padrão feminino de queda capilar tem seu pico de incidência na pós-menopausa com prevalência em 29% de mulheres entre 70 e 89 anos. Os mecanismos pelos quais ocorre este processo ainda são controversos, alguns autores atribuem a maios atividade de DHT (di-hidrotestosterona) em mulheres com níveis normais de testosterona, porém muitos trabalhos indicam o papel dos estrógenos na fisiopatologia da alopecia feminina, embora não esteja claro se os estrógenos inibem ou promovem a queda capilar.

Saúde óssea

A perda da densidade mineral óssea inicia-se alguns anos antes do último período menstrual, ou seja, durante a transição da menopausa, e não vários anos após a menopausa como se acreditava. Alguns trabalhos mostram que o termo perda de massa óssea pós-menopausa é equivocado, pois a perda de densidade mineral óssea (DMO) inicia alguns anos antes da menstruação final (menopausa propriamente dita)

O significativo declínio de estradiol (E2), cerca de dois anos antes da menopausa, é acompanhando de um significativo aumento de N-telopeptideo urinário (marcador de “turnover” ósseo), sugerindo que, o nível de E2 é um gatilho para a elevada perda de massa óssea e da cascata de “turnover” ósseo.

A perda óssea e a DMO são considerados indicadores da menopausa. Estima-se que a perda de massa óssea chega a 2 % nos primeiros 6 anos e de 0,5 a 1 % após esta fase.  O risco de fraturas osteoporóticas chega a 40 a 50% nas mulheres.

Desta forma, mostra-se muito importante, iniciar medida preventivas para o fortalecimento do tecido ósseo, vários anos antes do início do climatério.

Dieta rica em proteínas, aumento do aporte de cálcio e magnésio, manter elevados níveis de 25-hidroxivitamina-D, manutenção da atividade física regular,  controle do IMC,  são algumas medidas que certamente, contribuem para a saúde óssea.

Composição corporal

O estudo SWAN determinou a relação entre composição corporal, distribuição de gordura frente a transição da menopausa, as mudanças corporais iniciam-se 9 anos antes da menopausa e podem perdurar por até 9 anos após, de acordo com esta pesquisa.

Cerca de 2 anos antes do último período menstrual, o índice de ganho de gordura pode dobrar e a massa magra pode começar a cair, este processo perdura por cerca de 2 anos após a última menstruação antes de se estabilizar.

A perda de massa muscular, bem como o aumento da inflamação e da senescência celular, a redução da regeneração dos miócitos e da síntese de proteínas são causadas, entre outros fatores, pelo declínio na produção de hormônios sexuais, tanto os homens quanto as mulheres experienciam a sarcopenia relacionada ao declínio hormonal.

Vários estudos destacam a associação entre sarcopenia e osteoporose. A observação da interação fisiológica músculo-osso é essencial no sentido de prevenir doenças e perda de capacidade funcional no envelhecimento.

Estudos demonstram que mulheres que apresentam sarcopenia tem o dobro de risco para quedas e fraturas ósseas.

Entre múltiplos fatores importantes, o declínio musculoesquelético está relacionado também ao aporte inadequado de proteínas, cálcio e vitamina D e ao padrão de atividade física ao longo da vida, inclusive durante o climatério e na pós-menopausa.

A demanda por esses nutrientes naturalmente aumenta no envelhecimento devido ao aumento da resistência a proteínas anabólicas, a inflamação crônica e ao estresse oxidativo e isto deve ser levado em consideração nos cuidados durante a Transição da Menopausa. Desta forma, estratégias terapêuticas e nutricionais para fortalecimento e regeneração muscular atualmente são extremamente valorizadas.

 A falta de atividade física acelera o catabolismo muscular e é outro fator de risco muito relevante.  A atividade física minimiza muitos efeitos do envelhecimento, como a resistência a insulina, disfunção mitocondrial e a inflamação e ainda, representa a melhor estratégia para conter a sarcopenia.

Saúde Cardiovascular

As mulheres experienciam alterações no perfil lipídico, na distribuição de gordura corporal, no risco de síndrome metabólica e no risco cardiovascular (CV), no período de Transição da Menopausa.

A elevação de LDL-Colesterol no período em torno da menopausa está associada ao maior risco da presença de placas, e mesmo níveis mais altos de HDL-Colesterol podem não ser consistentemente protetores.

A redistribuição de gordura relacionada ao período de transição da menopausa pode afetar também a saúde cardiovascular.  Os hormônios sexuais e os sintomas vasomotores parecem estar relacionados às alterações CV adversas, com risco variável de acordo com os padrões de E2 e de sintomas vasomotores relacionados à menopausa.

O conhecimento sobre como a transição da menopausa influencia a saúde CV das mulheres evoluiu muito nos últimos 25 anos. A menopausa é atualmente considerada um fator de risco de doença CV feminina pela American Heart Association e foi reconhecida como fator agravante e determinante para início de terapia com estatinas pela atualização de 2018 do “Guideline” de manejo de colesterol sérico.

As alterações metabólicas envolvendo perfil lipídico aparentemente iniciam-se cerca de um ano antes da última menstruação.

Diferentemente do perfil lipídico, alterações na pressão arterial, insulina, glicose e IMC não estão diretamente associadas ao período de transição da menopausa, independentemente da idade cronológica.  Entretanto, o período de mais elevado risco de desenvolvimento de síndrome metabólica é a perimenopausa, e não está relacionada à idade.

Os sintomas vasomotores, que são o principal marcador da menopausa, foram associados ao perfil de maior risco cardiovascular, independentemente da idade ou dos hormônios sexuais. Foram associados também a níveis mais elevados de LDL-Colesterol, Apo B, triglicérides e resistência insulínica, com risco mais alto de hipertensão.

Saúde mental e cognitiva

Sintomas de depressão e ansiedade

Os sintomas de depressão e ansiedade são mais prevalentes na peri e pós-menopausa do que na pré-menopausa. Outros fatores como estilo de vida estressante, preocupações financeiras, baixo suporte social, distúrbios de sono e falta de atividade física são contribuintes importantes para sintomas depressivos e/ou ansiedade e estes fatos são independentes da transição da menopausa.

Dentre os hormônios que foram monitorados durante o estudo SWAN,  o único hormônio que demonstrou estar relacionado aos sintomas depressivos foi a testosterona.

Apesar de sintomas de ansiedade serem altamente prevalentes entre mulheres de 40 a 50 anos e podem preceder o estabelecimento de sintomas depressivos, sempre receberam menos atenção do que a própria depressão.

As probabilidades para sintomas de ansiedade são significativamente superiores na perimenopausa, imediatamente antes ou após a menopausa com o pico mais tardiamente.  Mesmo entre as mulheres que nunca haviam apresentado ansiedade anteriormente, muitas reportaram este sintoma no período de transição da menopausa, independentemente de outros gatilhos ou da presença de sintomas vasomotores.

O risco relativo para sintomas de ansiedade aumenta entre os períodos imediatamente anterior à menopausa, e podem declinar na pós-menopausa, o que sugere que este aumento da ansiedade pode ser transitório.

Performance cognitiva

As dificuldades cognitivas relacionadas a menopausa são caracterizadas pela ausência temporária de entendimento e aprendizagem durante a perimenopausa que se resolve naturalmente na pós-menopausa quando a aprendizagem volta ao normal. O declínio cognitivo relacionado ao envelhecimento inicia-se muito tempo mais tarde e está relacionado ao envelhecimento cronológico.

Aproximadamente 60% das mulheres em idade madura reportam problemas de memória durante o período de transição da menopausa, embora sejam raros os estudos que avaliam a performance cognitiva neste período.

Mesmo não existindo muitos estudos nesse sentido, as investigações disponíveis demonstram que não há associação entre o declínio de performance cognitiva com sintomas vasomotores ou com distúrbios de sono,  no entanto, as mulheres com depressão de fato apresentam menor pontuação na performance cognitiva e na rapidez de processamento de informações e aquelas com mais sintomas de ansiedade apresentam mais episódios de falta de memória verbal.

Quando estes sintomas são confrontados com o modelo de transição da menopausa e cognição, o efeito negativo da perimenopausa tardia na cognição permanece inalterado, sugerindo que a presença destes sintomas não estão relacionadas ao declínio de aprendizagem na perimenopausa.

Fica então a controvérsia se o declínio na performance cognitiva é parte do processo normal de envelhecimento ou se este processo inicia-se ainda na transição da menopausa.

Sono

As queixas de distúrbios de sono tendem a aumentar no período de transição da menopausa e condições ruins de sono podem ter um impacto negativo na saúde cardiovascular das mulheres.

O estudo SWAN teve um braço auxiliar especialmente dedicado à avaliação de parâmetros de sono e os resultados demonstraram que as mulheres com síndrome metabólica apresentavam menor eficiência de sono e maior incidência de apneia. Além disso, as mulheres com alterações nos indicadores de sono, também apresentavam biomarcadores inflamatórios e de coagulação elevados.  

Saúde do aparelho geniturinário e saúde sexual

Sintomas geniturinários

A falta de lubrificação vaginal aumenta no período de transição da menopausa na ordem de 19 % na perimenopausa e 34 % na pós-menopausa.  Além disso, a falta de lubrificação vaginal também contribui para a dor durante a atividade sexual (dispaurenia).  

O avanço dos estágios da menopausa é mais fortemente associado com a falta de lubrificação vaginal do que com o declínio de estradiol, o que demonstra que a sua etiologia é mais complexa do que somente a oscilação e declínio do nível de estradiol.

Incontinência urinária

A incontinência urinária é um sintoma frequentemente reportado entre mulheres durante o climatério que não está relacionado ao declínio de estradiol.

Cerca de 68 % das mulheres reportam incontinência urinária, ainda que eventual, e na maioria das mulheres são episódios transitórios e que não estão necessariamente associados aos níveis de estradiol ou ao seu declínio.  Menos de 40% dessas mulheres buscam tratamento para incontinência urinária, por acreditar que se trata de um processo natural de envelhecimento e porque o médico em geral não a questiona sobre este sintoma.

Função sexual

A função sexual começa a declinar cerca de dois anos antes do último período menstrual e este declínio diminui um ano após, permanecendo estável por cerca de 5 anos.

A função sexual é um componente muito importante da saúde da mulher e cerca de 75% das mulheres no estudo SWAN reportaram que atividade sexual era moderadamente ou extremamente importante.  Na transição da menopausa, a dispaurenia aumenta e o desejo sexual declina, independentemente de características sociodemográficas ou de mudanças físicas ou psicológicas.

Dados demonstraram que o nível de E2 não estava relacionado a nenhum parâmetro indicador de função sexual, porém o nível de testosterona foi positivamente associado ao desejo sexual e a excitação e vários estudos clínicos comprovam esta proposição. 

E assim…

Estudos como SWAN e outros, também com a mesma orientação de pesquisa, apontam fortemente para a janela de oportunidade terapêutica, período ideal, para manutenção ou estabelecimento de comportamentos de saúde positivos que atrasem ou previnam prognósticos negativos para a saúde ou declínio funcional ao longo do processo de envelhecimento.

Parar de fumar, adotar dieta saudável e equilibrada, a prática regular de atividade física são alguns fatores que podem reduzir significativamente o risco de doenças cardiovasculares,  melhorar muito a condição musculoesquelética reduzindo a perda de massa óssea e muscular, da mesma forma as intervenções precoces no estilo de vida são medidas terapêuticas profiláticas que podem atrasar ou reduzir o risco de fraturas óssea, a osteoporose e a sarcopenia.

De maneira geral, o aumento da expectativa de vida para mulheres pós-menopausa aponta para a necessidade de melhorar a sua qualidade de vida, faz-se necessário desenvolver estratégias terapêuticas específicas, associadas a terapia de reposição hormonal ou não.

Referências

Agostini D., Zeppa S.D., Lucertini F., et al.; Muscle and Bone Health in Postmenopausal Women: Role of Protein and Vitamin D Supplementation Combined with Exercise Training; Nutrients 2018, 10, 1103

Barth C., de Lange A.M.; Towards an understanding of women’s brains aging: the immunology of pregnancy and menopause; Frontiers in Neuroendocrinology, 2020; 58; 100850

Borda L., Wong J. L., Tosti A., et al.; Bioidentical hormone therapy in menopause: relevance in dermatology; Dermatology Online Journal, 2019; vol.25, n.1

El Khoudary S.R.; Greendale G, Crawford S.L., et al; The menopause transition and women’s health at midlife: a progress report from the Study of Women’s Health Across the Nation (SWAN); The Journal of The North American Menopause Society, 2019;  Vol. 26, No. 10, pp. 1213-1227